Nos idos de 1968, era comum muitas companhias terem militares ou ex-militares em seus quadros. Numa empresa que trabalhei como office boy, então com 14 anos de idade, o Capitão Gomes cuidava da Administração (equivalente hoje a Facilities Management) e era meu gerente direto. Ele me chamava por Senhor José Carlos (imagine, eu, com 14 anos, sendo tratado por “senhor”). O Capitão tinha voz pausada e era um grande cavalheiro.
O escritório central da empresa era no bairro do Cambuci e a fábrica localizava-se na Vila Independência, no Ipiranga, próxima de onde eu residia.
No final do ano, o Capitão Gomes me disse que haveria uma festa de confraternização na fábrica e que eu poderia ir com ele, mas eu não poderia esquecer de separar uma caixa de vinhos que ele levaria para a confraternização. Fiquei feliz, pois economizaria o dinheiro de dois ônibus (na época não havia vale-transporte nem vale-refeição, tudo era custeado pelo trabalhador).
Como havia mais dois office boys na empresa, fazíamos uma algazarra e nisso me esqueci de colocar o vinho no veículo do Capitão Gomes.
No caminho, o Capitão me perguntou se eu havia separado o vinho. Eu disse que esquecera.
Então ele me disse: “pegue um táxi com seu dinheiro, vá buscar o vinho e se você chegar depois de mim, na fábrica, será demitido”.
Ao chegar à fábrica, entrei para entregar o vinho, mas o Capitão Gomes ainda não havia chegado. Estranhei o fato, mas dez minutos depois ele entrou com seu veículo e nada entendi.
Mais tarde, me disseram que o Capitão havia estacionado seu veículo duas quadras antes e me esperou entrar, para só então aparecer.
Essa atitude me trouxe alguns ensinamentos, como disciplina e responsabilidade e, acima de tudo, que um líder jamais abandona o seu liderado, ou seja, na guerra, um comandante nunca deixa para trás o seu soldado.
No final, o Capitão Gomes me parabenizou por ter cumprido a missão e me reembolsou o valor gasto com o táxi.
Sensacional! Inspirador, eu diria.